Pedreiro e contratante atuam em causa própria e juíza dispensa “juridiquês” na sentença
Juíza do Trabalho Tatiane Pastorelli Dutra, da 3ª vara de Mauá/SP, conduziu a audiência em que as partes não foram representadas por advogados.
- 19 de fevereiro de 2019
- Redação
- Trabalhista
O dia 8 de fevereiro teria sido um dia comum na 3ª vara do Trabalho de Mauá não fosse por um detalhe: em uma das audiências, nenhuma das partes estava representada por advogado, e ambas atuaram em causa própria. Na sessão, a demanda tratada havia sido ajuizada por pedreiro contra sua contratante. A audiência foi conduzida pela juíza do Trabalho Tatiane Pastorelli Dutra, substituta da vara.
Em vídeo, a magistrada diz que a experiência foi "gratificante". Assista.
O pedreiro ingressou na Justiça alegando não ter recebido pelos serviços contratados pela contratante. Em sua alegação, apresentada oralmente durante a audiência, afirmou que havia sido contratado para realizar um serviço no valor de R$ 5 mil, mas que somente R$ 3 mil haviam sido pagos. A mulher, em sua defesa, afirmou que, embora tenha contratado o pedreiro, ele não terminou o serviço, abandonando a obra.
Tanto na audiência como ao redigir a sentença, a magistrada optou por dispensar o formalismo linguístico – conhecido como “juridiquês”, para que os demandantes pudessem entender o que fosse decidido no caso.
Ao julgar o mérito, a juíza pontuou na sentença que, “como é de conhecimento popular, quem afirma alguma coisa precisa provar o que diz”. Assim, levou em conta depoimento de testemunha presente à audiência que afirmou que o serviço contratado pelo pedreiro de fato não havia sido finalizado
Segundo a magistrada, o pedreiro “pode até ter razão quando diz que o que foi combinado tem que ser cumprido”.
“Para isso, o Direito até usa um termo em outra língua, chamada ‘latim’, para mostrar que, desde tempo muito antigo, as pessoas precisam cumprir o que prometem para as outras (- artigo 422 do pacta sunt servanda Código Civil)”, explicou a magistrada.
Apesar disso, a julgadora entendeu que, como a contratante conseguiu comprovar o abandono da obra na audiência, o autor não pode obrigá-la a pagar todo o valor combinado, “pois deixou de cumprir a sua parte de forma completa, quando largou a obra sem terminar. É o que garante a lei (exceção do contrato não cumprido - artigo 476 do Código Civil)”.
Assim, julgou improcedente o pedido do pedreiro. A juíza Tatiane Pastorelli Dutra também deferiu a gratuidade da Justiça para ambas as partes e determinou que os litigantes tomariam ciência da decisão por mandado, devendo o oficial de Justiça explicar a cada uma delas o que foi decidido.
Jus postulandi
Conforme o TRT da 2ª região, as partes atuaram em causa própria no processo em observância ao artigo 791 da CLT, que confere às partes o direito de postularem sem advogado. Segundo a juíza, esse tipo de processo é possível em virtude do princípio do jus postulandi, “mas não é comum”.
“Eu tomei um susto quando vi que nenhuma das partes estava representada por advogado. Foi tudo tão inusitado que advogados de outros processos foram assistir à audiência, que ficou cheia e, inclusive, durou mais tempo que o normal, pois tivemos que prever o que iria acontecer e nos adaptar. A defesa, por exemplo, foi feita de forma oral”, afirmou.
A magistrada considera que o princípio é importante, pois é uma oportunidade de aproximar o Judiciário das pessoas que, no caso, estavam em condições de igualdade. Por essa razão, decidiu adaptar a sessão e à decisão à linguagem comum.
“Quando comecei, estava fazendo como uma sentença normal, mas fiquei pensando nessas pessoas e me coloquei no lugar delas. Como elas, que estão sem advogado, vão conseguir decifrar quem ganhou ou quem perdeu, se teriam que pagar alguma coisa? Com base nisso, optei por fazer uma coisa diferente do que faço no dia a dia. Ainda depois de escrever, revi as frases várias vezes e fui trocando as palavras rebuscadas por expressões simples.”
Processo: 1001108-19.2018.5.02.0363
Veja a íntegra da sentença.
Fonte: Migalhas
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